Blythe Doll Picture by: sallylouvintage.wordpress.com |
Foi numa dessas noites perdidas que tudo mudou.
Numa simples ida à biblioteca para fingir que estudava
como todos os outros quando na verdade apenas se divertia a tentar imaginar a
vida de cada um atrás dos ecrãs dos computadores, ou de outros
perdidos nas calculadoras e folhas de exames.
Sentou-se numa das mesas reservadas para os
grupos de estudo. Sempre com o seu sorriso traiçoeiro e com a resposta pronta
de quem sabe muito bem o que quer mas que no fundo só se engana a si própria. Ninguém
olhou para ela, pois podia muito bem ser uma simples aluna na qual ainda não
tinham reparado. Lugar perfeito, vista para o pátio, ficha tripla para todas as
tecnologias necessárias e mais alguma. All set para a sua noite perfeita do seu
estudo. As primeiras horas decorreram como planeara: descobriu quem eram os
namorados, os pretendentes secretos que se contorciam nas cadeiras quando ela
passava, os madrugadores, os chatos, e tudo o resto. Mas como todo o hobby e
todos os que ela tinha tido ultimamente, fartou-se. Começou por tirar o livro
do saco e tentar ler o primeiro capitúlo sem as habituais interrupções das
suas ideias desvairadas. Desistiu mais uma vez, foi fumar o seu primeiro
cigarro da noite/dia quando reparou que o lugar do lado já não estava ocupado.
Não tinha tido tempo de memorizar os traços, mas do pouco que tinha reparado
tinha em mente que era uma rapariga bastante agitada com um perfume parecido
com o seu. Cabelo aloirado muito comprido também. O olfato nunca a deixava
ficar mal, sempre fora o seu sentido mais apurado e aquele cheiro era sem dúvida inconfundível. Como um toque suave de flores silvestres misturado
com uma ou duas gotas de limão. Na verdade sabia toda a composição de cor pois
era da sua autoria. Desde pequena que adorava dar aso à suas ideias
desta maneira. Tanto que no dia do seu 11˚ aniversario, os
pais lhe tinham oferecido um kit completo que ela usava até hoje para poder inventar e manipular todas as fragrâncias que lhe
vinham a flor da pele- incluindo o seu próprio perfume. Tinha a certeza de ter
reconhecido aquele cheiro único e inimitável que ela tanto tinha demorado a
encontrar. A combinação perfeita que mais ninguém poderia ter. Única como ela.
Agora na pele de uma estranha que ainda há pouco estava sentada a meio metro
dela.
Perdida nos seus pensamentos, só se alertou com
o nascer do dia quando reconheceu o palrear dos passarinhos já há muito
cansados de cantar. Caminhou até à saída da
biblioteca, quando distraídamente tropeçou nalguma coisa.
Levantou-se rapidamente e então reparou no que estava caído aos seus pés. Um
pequeno Moleskine vermelho com o a sigla da biblioteca. Provavelmente um
esquecido por alguém. Nada de especial, por isso não ligou. No entanto a curiosidade
falou mais alto, para variar. Voltou-se para verificar que ninguém a estava a
observar e apanhou o caderno. Só para ver. De facto não era nada de especial,
mas ao folhear as páginas encontrou um cartão de sócio
de uma estudante e um velho bilhete de autocarro com destino a Hyde Park.
Lisa Laarsen, sócia numero: S00304951.
O nome obviamente não lhe disse nada/ não lhe lembrou
de ninguém mas a sua expressão tinha alguma coisa de familiar. Cá fora, já no seu segundo cigarro, analisou a fotografia com mais calma.
Podia muito bem ter entregue o conjunto todo na recepção. Com certeza quem o
havia perdido ia voltar a procurá-lo, sobretudo nesta época de
exames. Viu então no cabelo comprido com seus reflexos platinados e percebeu todo
o ar de mistério que aquela rapariga lhe inspirava. Uma cara angular e pequena,
não especialmente bonita mas com uma expressão que lhe
chamou à atenção. Como uma mentira descarada que o tempo tinha estampado naquele
rosto fora do vulgar. Mas porquê?
Ao chegar a casa, despiu o “disfarce” e
enrolou-se nas profundezas dos lençóis, sempre a imaginar todos os enredos mais
impossíveis do seu catálogo de filmes favoritos que se
aplicassem à situação. Finalmente conseguiu
sossegar: sabia exatamente o que fazer com o pequeno caderno e o sono veio sem
mais demora.
3 comentários:
um misto de Amelie e Lisbeth, com muita autobiografia à mistura? ihihihi.
fico à espera dos próximos capitulos. beijinhos!*
e adorei a boneca! não sabia que também gostavas das cabeçudas. :)
e <3 moleskines, ptto o resto da história promete.
Acho piada as bonequitas,tipo mini pessoas :) espero que o proximo capitulo esteja a altura:ta a ser cozinhado ehehe bisouuu
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